quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

“Quem são? Onde estou? Que faço aqui? “

Ahhhhhhhhhhh!!! – foi com um grito que João acordou.
Era como se estivesse a cair, abruptamente, num poço sem fundo. Uma sensação de falta de ar, de impotência, de vazio.
Ainda de olhos cerrados, sentiu-se observado.
À sua volta estavam três vultos. Três pessoas. Três indivíduos, totalmente desconhecidos.
“Quem são? Onde estou? Que faço aqui? “
Permanecia deitado no chão e era observado por Maria. Uma simpática senhora, de 35 anos que se cruzava todos os dias com o João, no metro. Sempre com um ar tristonho, um dia ouviu-a comentar com uma amiga como seria mais feliz se o seu marido fosse mais romântico. 

“Que pena, espero que encontre um verdadeiro príncipe encantado”- pensou João ao escutá-la.
Junto a Maria, estava Xavier, o coxo. Um jovem vizinho do João que, depois de um acidente de moto, quando vinha do trabalho, ficou com alguma dificuldade na perna direita. Mesmo assim, ajudava sempre a idosa do quarto andar.
“Coisas destas só acontecem a boas pessoas. Merecia um milagre” – pensava muitas vezes  João.
Mesmo à sua frente apresentava-se a Julieta, a nerd lá do escritório. Uma inteligente mas acanhada miúda do departamento de marketing. A combinação dos seus óculos e massa com o teclado do computador, faziam dela a ave rara do escritório. Só reparavam nela para chacota.
“Só um cego é que não vê que ela é mesmo gira. Pena não verem aquilo que consigo ver”, suspirava (muitas vezes) o João.
Hoje a Maria é feliz, encontrou um grande amor.
O Xavier voltou a caminhar normalmente, até joga futebol.
A Julieta mostrou seu talento. É diretora criativa (e passou a usar lentes de contacto e cabelo solto).
Os desejos do João tornaram-se realidade. Foi uma dádiva que lhe fora concedida em tempos, sem que ele soubesse disso.
Sem saber como, também, estes abençoados souberam disso e juntaram-se para homenageá-lo.
Contudo a vida pregou-lhe uma partida, mesmo sendo o João um anjo da boa vontade.
Convivia diariamente com o Pedro. Competia com ele todos os dias pelo jornal, no café central. Sentia essa competição, havia dias em que as notícias até pouco importavam, mas ele queria ler primeiro. Achava que o Pedro lhe ocupava o jornal de propósito, como provocarão.
“Estou farto de esperar pelo jornal. Este chato podia esquecer-se do caminho para este café” – pensou o Pedro.
E assim, o João se esqueceu.
Esqueceu tudo. Esqueceu quem é.


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