Altivo. Egoísta. Orgulhoso.
Emílio Vicente era assim.
Filho único de um casal da classe alta. Regido por uma autoridade exímia
passada por um pai militar e por uma mãe devoluta das aparências socias,
desenvolveu - quase que obviamente - características que o distinguiam de todos
os outros.
Sempre lhe exigiram que fosse o melhor – “era um Vicente!” – tinha de
zelar pelo seu ego especial, alimentado por uma luxúria e vaidade paternal.
Tornou-se no melhor dos melhores.
No desporto, campeão várias vezes de ténis (era impensável a prática de
um desporto coletivo que não realçasse as suas capacidades individuais de
jogador.
Profissionalmente, era um gestor /ditador. De pouco relacionamento social
com os seus colaboradores, media tudo a regra e esquadro, somas e subtrações, divisões
e multiplicações.
Nada mais interessava.
Chegou longe. Ganhou milhões.
Era meticuloso. Perfeccionista. Lunático (quase) com os pormenores.
Gostava de ser o actor principal em tudo. Sempre o melhor. A vedeta, a
estrela. Contudo, no encalce deste patamar
maltratou, pisou, desrespeitou.
Um dia, aos 55 anos, percebeu, num pequeno rasgo de lucidez emocional
que era um homem só. Apercebeu-se da solidão que o rodeava. Já não tinha
ninguém com quem competir, ninguém a quem se mostrar, ninguém para o venerar.
Os pais já haviam morrido e todos os outros se tinham fartado dele.
Estava mais velho, já ninguém lhe ligada.
Encontrou apenas um caminho: o suicídio.
Um qualquer desesperado teria agarrado na primeira arma e teria acabado
com a própria vida.
Emílio não. “Sentou-se na secretária, levou as mãos aos lábios, meditou, e reescreveu a
morte”, até atingir a perfeição.
Quis fazer um guião da cena final da sua vida, carregada de drama,
emoção e singularidade.
Quis que todos soubessem que ate na morte se distinguiu.
Morreria, mas sempre como um actor principal.
Pena que esta peça tenha decorrido sem público algum na plateia.
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